Saturday, March 8, 2008

O sermão dos peixes ao Santo António

Algures durante a minha inocência, provavelmente quando frequentei a escola Padre António Vieira, ouvi falar de um sermão de Santo António aos peixes.  Na minha cabeça cedo se formaram imagens de um homem simples parado junto a uma margem a pregar uma valente seca a um bando inocente de peixes, que pouco ou nada tinham a ver com o assunto, e que provavelmente estariam lá a tentar perceber o que quereria aquele homem com eles. Tenho de admitir que só tive consciência sobre o que realmente era aquele sermão bastante mais tarde.
 
Hoje em dia a situação mudou. A inocência já não é tão inocente, os homens já não são tão simples, e os peixes ficaram bastante mais espertos. Aliás os peixes ficaram tão espertos que em vez de se limitarem a ouvir começaram a falar e a fazer os seus próprios sermões. 
Veja-se o que aconteceu hoje na manifestação dos professores. 
 
 
Temos de um lado um belo e numeroso cardume, que segundo os números avançados pelos sindicatos chegou ao belo número de 100 mil professores (e outros) que resolveram pregar o seu sermão de indignação. 
Do outro lado temos uma mulher que argumenta que o número de 100 mil peixes... perdão... professores, "não é relevante".
  
Claro que isto disto assim e somente assim pode provocar reacções mais a quente, mas a realidade é que a senhora Ministra da Educação tem toda a razão porque para ela até se fossem somente mil professores já seriam muitos, e que o essencial é que os professores não estão satisfeitos. 
  
Na minha imaginação sempre calculei que os peixes percebiam que aquele homem, ali especado diante deles a falar, deveria estar realmente insatisfeito, contudo sempre duvidei da sua capacidade ou disponibilidade para saberem realmente o porquê dessa insatisfação.
Eu, ao contrário de muitos, não questiono a capacidade de compreensão da Ministra da Educação, questiono sim a sua real disponibilidade. 
Já lá vão uns meses desde que se começou a assistir a esta novela da educação e desde cedo que se verificaram episódios em que os professores manifestaram a sua insatisfação, muitos deles com mais actores do que os tais mil referidos pela senhora ministra. E só agora a senhora ministra descobriu a insatisfação dos professores? 
  
  
Apesar do grau de pureza da inocência já não ser o quer era, tenho que admitir que há pormenores em tudo o que está a acontecer que me faz acreditar nela, pelo menos por parte dos professores. 
  
Numa das reportagens televisivas deram a hipótese aos professores de colocar questões directamente à Ministra da Educação, e todas as questões colocadas foram... vou utilizar a palavra inflamadas. Com um condão especial de todas elas não acrescentarem nada de especialmente interessante ao debate que se pretende e de permitirem uma saída airosa e leve à principal visada. 
  
  
Enfim o debate já vai longo, este texto também, portanto em jeito de conclusão, tenho que dar razão à Ministra quando diz que as reformas na educação são necessárias, havendo um consenso geral de que o estado geral da educação em Portugal tem andado muito perto do calamitoso. 
É preciso alguma coragem para mudar os mecanismos e , infelizmente, a mudança incomoda muita gente, que não vai ficar parada de braços cruzados sem montar alguma oposição. 
A inteligência de um governante é demonstrada pela sua capacidade de ouvir e perceber, no meio de tantas criticas e oposição, os pontos que apontam para os problemas graves, ou que de alguma forma podem melhorar e trazer mais valias às políticas. 
  
  
Acredito que quando os peixes interpelaram o Santo António com tão ruidoso sermão, o fizeram com a intenção de melhorar um sistema onde são elemento definidor e elemento dependente, portanto, e para o bem geral, espero que o sermão dos peixes chegue ao Santo António, e este, como homem inteligente que é, deve reflectir sobre ele sem julgamentos prévios de razão, de certo ou errado. 
O fruto dessa reflexão será benéfico para todos. 
  
  
Referências úteis:

No comments: